Mapa : Revista O Cruzeiro, de 10 de janeiro de 1953
Pág. 282 do livro Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto
Pág. 282 do livro Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto
O tesouro de Cláudio Manuel
Autora: Angela Xavier
Muitos são os buscadores de
tesouros em Ouro Preto. Alguns gastaram anos de sua vida em busca de pistas,
mapas e sinais que, muitas vezes, não levaram a nada. Mas o ser humano tem uma
força dentro de si que o faz se empenhar, embrenhar nas matas, entrar em grutas
escuras e desconhecidas, acreditar no improvável, apoiando-se num sonho.
Existe um tesouro ainda
escondido: o tesouro de Cláudio Manuel. Talvez um tesouro patriota, guardado
para a construção do país, para quando o Brasil se separasse de Portugal.
Muitos foram aqueles que
buscaram por ele: o famoso tesouro dos inconfidentes! Seriam muitas arrobas de
ouro escondidas num local de difícil acesso, próximo ao Pico do Itacolomi. O
local estava indicado em documento, acompanhado de um mapa, com as indicações
do local. Teria muitas pedras empilhadas e era preciso muito cuidado, porque
elas teriam sido juntadas com certa massa alemã que explodiria dependendo do
atrito. O local ficaria perto de uma cachoeira, na junção do Córrego do Baú com
o Córrego do Itacolomi. Ali existiria uma grande pedra onde estariam gravadas
as letras “CM”, de Cláudio Manuel.
Alguns caçadores de tesouros
chegaram a localizar uma mina e entraram dentro até um grande salão. Chegaram a
desmanchar muros de pedra dentro da mina e a tal massa alemã não explodiu. Era
uma mentira para desencorajar os menos ousados! Aquilo era barro usado na
junção das pedras.
O grupo percorreu o que foi
possível dentro daquela mina e desmontou muitos muros em busca de vestígios.
Havia degraus de pedra por dentro, feitos por escravos. Depois de descer uns
dez metros mais ou menos, eles chegaram a um salão. O grupo trabalhou ali por
mais de três anos e não achou nada. Dizem que as galerias desta mina chegam até
o distrito de Itatiaia.
Um dos membros do grupo
morreu dentro da mina, durante a busca do tesouro. Oficialmente a causa da
morte foi por um problema cardíaco, agravado por dificuldades respiratórias. O
povo comenta que ele foi morto pelo espírito do ouro que tanto buscou.
Nas décadas de 1940 e 1950,
havia muitos caçadores de tesouro, percorrendo os arredores de Ouro Preto, na
esperança de encontrar o tal Tesouro dos Inconfidentes.
Fato realmente extraordinário
aconteceu com os cidadãos ouro-pretanos Inácio Pinheiro e Gilberto de Carvalho,
no ano de 1939. O Instituto Butantã comprava cobras, aranhas e escorpiões para
fazer vacinas e o então jovem Gilberto de Carvalho saiu procurando tais bichos
nas horas de folga para ganhar um dinheiro extra. Revirando o porão de sua
casa, onde fora a antiga Casa de Fundição de Ouro Preto, hoje Colé Presentes,
ele encontrou uma caixa de madeira e dentro dela alguns documentos muito
antigos, preservados em carvão. O documento era de 1788 e assinado por Domingos
Affonso Bastos, que transcrevo na íntegra:
“Bocaina do Triphuy
Aos 12 dias do mês de dezembro do ano do nascimento
do Nosso Senhor Jesus Cristo de 1788.
Senhor Doutor Cláudio Manoel da Costa, por esta carta
só tenho que fazer uma confissão sobre a vinda do senhor Domingos aqui. Passei
algumas aflições para cumprir as tuas ordens, mas na mesma noite eu e o senhor
Domingos matamos os sete escravos e o capataz, de acordo com seus mandados, e
por minha conta matei a mulher do capataz. Isto fiz para nosso tamanho
sacrifício não ser descoberto. Depois que me coube esta missão de derramar
tanto sangue não deixei nenhuma testemunha a não ser a terra porque esta não
tem boca para falar.
A mina, fechei o portão com a chave, dei algumas
cargas para fazer o arreamento. Conforme o senhor queria não pôde ser devido as
cargas mais fundas negarem. Só arriou uns 20 passos... A chave da mina deixei
atrás do arco da ponte dentro de uma pedra lavrada, isto é, na entrada da ponte
vindo da Vila para cá e o ouro que a mina produziu neste dois meses foram 405
barras com o peso de 3 libras e meia cada uma e para fundir mais 214 arrobas.
Não tive tempo de embarrar tudo devido a sua carta e a minha moléstia que tem
agravado mais. Tenho posto muito sangue estes dias. Pobre de um homem hético
que deseja trabalhar e não pode e creio que não espero estes dias de nossa
tranquilidade e como estou muito desconfiado com meu estado.
Declaro aqui que encontrei uma mina velha e esta
aproveitei para esconder este ouro já apurado, 405 libras que estavam aqui. Esta
mina só tem uns 60 passos de fundura e nela fiz um arreamento de 20 passos que
é bastante, para o caso de perigo não ser descoberto este ouro apurado e como o
senhor não sabe onde fica esta mina... a partir da ponte pelo rio acima do lado
esquerdo fica este em frente do fojo que o senhor pegou os quatis, distante do
fojo 16 passos da mina nova fica distante 380 passos, isto é, para o saber
tudo.
Com esta carta também vai este desenho para melhor o
senhor compreender caso o senhor queira tirar este ouro com pouco trabalho; no
fundo da mina velha tem um suspiro e neste pus uma cruz de braúna conforme este
desenho.
Domingos Affonso Bastos”
Imediatamente Gilberto entrou
em contato com Inácio Pinheiro e os dois saíram atrás das indicações daquele
tesouro. Seguiam o roteiro indicado no documento e chegaram à pedra lavrada no
arco da ponte de Bocaina do Tripuí. Emocionados, tiraram a pedra e, dentro do
local, encontraram uma chave de ouro maciço. Prosseguindo nas buscas,
encontraram os nove esqueletos dos sete escravos, do capataz e sua mulher,
mortos na ocasião do ocultamento do tesouro. Tudo ocorria de acordo com as
indicações. Eles estavam muito animados e contrataram homens para ajudar.
A chave deu 64 gramas de ouro
que eles venderam por um conto e quinhentos. Precisavam de dinheiro para
prosseguir com as buscas. Gilberto de Carvalho comprou o terreno onde estaria a
mina e passou a buscá-la incessantemente. Apostou tudo que tinha nesse sonho,
mas não conseguiu encontrar a mina. Nas palavras do próprio Gilberto:
– De minha parte gastei 40
contos nas pesquisas. A mina deveria estar ali por perto. Mas esta é uma região
em que os efeitos da erosão são quase inacreditáveis. É muito comum uma
bananeira “viajar” muitos metros dentro desses quintais de Ouro Preto.
Esse foi o motivo alegado
para o fato da mina não ter sido encontrada depois de anos de buscas.
Aos dois pesquisadores,
juntou-se José da Costa Carvalho Filho, e os três foram ao Rio de Janeiro pedir
financiamento. Precisavam de capital para continuarem as buscas do grande
tesouro que seria dividido entre eles e o Governo Federal.
Getúlio Vargas era muito
sentimental em relação a Ouro Preto por haver estudado na cidade em sua
juventude. Ordenou o empréstimo de 300 contos de réis para a empreitada. Os
pesquisadores do tesouro passaram meses no Rio de Janeiro às voltas com o
Ministério da Fazenda, o Banco do Brasil e o Código Civil. Tamanha burocracia
jogou por terra as pretensões dos três sonhadores e, com pouco dinheiro,
voltaram decepcionados para Ouro Preto.
Esses homens passaram o resto
de suas vidas atrás deste sonho: encontrar o tesouro do inconfidente Cláudio
Manuel da Costa. Gastaram dinheiro, energia e tempo na empreitada. Não foram
vitoriosos, mas viveram uma grande aventura.
– Posso dizer que conheço
Ouro Preto por cima e por baixo da terra. Está tudo esburacado. Mais de uma vez
penetrei nesse labirinto num dia, para sair exausto no dia seguinte. É uma
coisa louca o entrelaçado das antigas minas abandonadas. Podem me chamar de
doido, mas acredito na existência desses tesouros. Disse Inácio Pinheiro.
Obs: Documento original, mapa
e reportagem da revista O Cruzeiro, de 10 de janeiro de 1953, fornecidos pela
família de Gilberto de Carvalho.
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Págs. 279 a 284.
Edição do Autor; Ouro Preto (MG); 2009 (2ª edição).
Obs.: Esta postagem foi realizada mediante prévia autorização da autora.
Para mais "causos" e contos de Angela Xavier, acesse o blog dela:
Compartilhando Histórias
http://www.angelaleitexavier.blogspot.com.br
http://www.angelaleitexavier.blogspot.com.br
Livro : Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto
O livro reúne mais de 70 histórias, ambientadas do século XVIII até início do XX, coletadas junto a moradores ou em livros sobre a cidade. Olavo Romano, responsável pelo prefácio, afirma que "Ouro Preto era cheia de fantasmas, uma cidade mal iluminada, repleta de capelas e cemitérios, onde ninguém saia de casa depois das 21 horas. Trata-se de um livro que narra a História de Ouro Preto de uma forma agradável, à maneira dos contadores de histórias, e está entremeada de lendas e causos. Começa chamando a atenção do leitor para a necessidade de se preservar aquilo que faz parte da nossa memória e relata a descoberta do ouro, os conflitos que surgiram no início e as revoltas".
A ênfase do livro é dada às histórias dentro da História, nas curiosidades que os livros de História não relatam, na sociedade que se formou ao redor das minas de ouro com suas crenças, seus valores e sua religiosidade. Relatos de grandes festas, de muitos casos assombrados e tesouros escondidos. A ilustração, com desenhos em bico de pena, é do artista plástico ouro-pretano José Efigênio Pinto Coelho.
A ênfase do livro é dada às histórias dentro da História, nas curiosidades que os livros de História não relatam, na sociedade que se formou ao redor das minas de ouro com suas crenças, seus valores e sua religiosidade. Relatos de grandes festas, de muitos casos assombrados e tesouros escondidos. A ilustração, com desenhos em bico de pena, é do artista plástico ouro-pretano José Efigênio Pinto Coelho.
Claudio Manuel da Costa, gastou todo o dinheiro em jogo de sinuca nos bares de Ouro Preto, era um perdedor compulsivo. Acharam uma carta escondida na cabeceira da cama em que morreu Tiradentes, em que ele deixou registrado cada valor perdido jogo por jogo.
ResponderExcluirSério, muito bom relato. Creio, que em cada cidade histórica, onde se explorou a mineração, deva ter escondido e perdido muita riqueza, deixados pelos sonegadores de impostos.
Grande abraço do Universo
Grato pela contribuição, Universo.
ExcluirAs histórias que, somadas, formam a História, dão um tempero especial aos fatos, personalizando-os e tornando-os mais humanos.
Um abraço.
Bela história, Sylvio, nunca ouvira falar dela. Dá um belo roteiro para um filme de aventura.Quando era menino, brinquei de caça ao tesouro: enterrava vidros coloridos e outras bugigangas, fazia mapas e depois, com os colegas ia "procurar".Delícia de brincadeira. Mas essa história cheira a verdade, só falta achar o tesouro. Abraços.
ResponderExcluirGrato por seu comentário, João.
ExcluirAssim como você, eu também acredito que esta história cheira a verdade. Vai saber... Tem tantos "causos" que convencem a gente!
Sylvio, bela história, eu sou pesquisador passo horas no Google pesquisando, pena que não encontrei a ponte. Seria pedir demais que você me passasse as coordenadas dela, já encontrei até os decretos, um do Juscelino outro do Getúlio, autorizando os caras á pesquisar. meu email adaoorion@gmail.com.
ResponderExcluirOlá, Adão.
ExcluirGostaria muito de conhecer mais sobre o assunto e poder ajudá-lo, mas sei apenas o que está escrito no conto acima.
A Angela, escritora do livro aqui mostrado, mora em Ouro Preto e talvez possa lhe dar a informação que deseja.
Seguem os contatos que possuo:
E-mail:
angelaxbr@yahoo.com.br
Blog Compartilhando Histórias
http://angelaleitexavier.blogspot.com.br/
Obrigado Sylvio,vou entrar em contato com a Ângela, um forte abraço.
ExcluirAdão boa tarde, conseguiu encontrar as coordenadas e se foi ao local tem fotos? Esses fatos são muito interessantes e gosto desses assuntos históricos.
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