Interior da Mina do Chico Rei
( Ouro Preto - MG )
Foto : Sylvio Bazote
( 25 Jan 2014 )
( 25 Jan 2014 )
Ouro encontrado, ouro escondido
Autora: Angela Xavier
O povo costuma dizer: “O ouro é caprichoso. Quando há muita
ambição, ele some”. Os relatos que ouvi comprovam esse dito.
Por ocasião
da construção da estrada Ouro Preto – Mariana foi necessário fazer um desvio
para veículos pesados. Para os serviços de trator foi contratado um homem de
apelido Baiano, sujeito forte, moreno, com enormes bigodes, que ele sempre
alisava e torcia num cacoete bem característico.
Trabalhava ele com seu trator, abrindo a
estrada, quando topou com um cruzeiro enorme feito de braúna. Ele parou, pensou
um pouco e depois passou o trator por cima. Se era para abrir a estrada, devia
derrubar tudo que estivesse no caminho. Mas, qual não foi a sua surpresa quando
apareceram duas botijas de barro ao pé do cruzeiro. Era do conhecimento de
todos que algumas pessoas costumavam enterrar ouro e juntar pouco a pouco, sob
o cruzeiro, até ter a quantia suficiente para construir uma capela para o santo
de sua devoção. Baiano já havia escutado esta história e por isso estava
trêmulo de emoção com a sua descoberta. Tentando despistar, já que seu ajudante
nada vira, pediu a ele para comprar qualquer coisa de beber num bar próximo e
lhe deu o dinheiro. Quando o ajudante voltou, o trator ainda estava ligado, mas
o Baiano havia desaparecido. No chão estavam as botijas de barro, quebradas.
Correu pela cidade a notícia de que o Baiano havia encontrado um tesouro. O fato é que, ele nunca mais foi visto por
essas bandas.
É crença
geral que, quando a pessoa tem um tesouro escondido e morre, ela aparece para
mostrar onde ele está. Enquanto isto não
acontece, a alma não tem sossego e fica penando. Em busca do descanso eterno, o morto aparece para
as pessoas de quem gosta, indicando o local. Essa pessoa deve ir sozinha e não falar do assunto a ninguém.
Mas tem um detalhe: se o tesouro não é para determinada
pessoa, que apenas ouviu algum relato e saiu a procurar, não adianta insistir,
porque não vai encontrar. Pode estar andando sobre ele, mas não acha.
O caso a seguir ilustra esta crença.
Lá pelos anos 30, 40 do século XX, havia um rapaz muito valentão, conhecido pela alcunha de Teco Mulambo, morador do Alto da Cruz. Ele brigava sempre nas noitadas e batia em todo mundo, mas nunca apanhava. Vivia contando suas façanhas de homem corajoso e indomável. Todos tinham medo dele no Alto da Cruz. Ele costumava ir ao bar e chutar o balcão, derrubando doces e copos. O proprietário nem abria a boca pra reclamar, senão apanhava. O valentão dizia: – Eu não tenho medo de nada! Se encontrar uma mula-sem-cabeça, eu monto nela. Ah! Mas monto mesmo! E se aparecer diante de mim um lobisomem, eu faço toucinho da carne dele.
Era admirador
de Lampião, por isso andava com um chapéu de cangaceiro na cabeça. Costumava
subir ao Pico do Itacolomi a cavalo e andava por aquelas bandas, sozinho,
procurando ouro.
Um dia,
Teco Mulambo passou perto do local onde o Baiano havia encontrado o tesouro ao
pé do cruzeiro de braúna. Vasculhou todo o local. Bem perto ele avistou uma mina
com a entrada escondida pelo mato. Ficou animado com a possibilidade de
encontrar ouro lá dentro e desceu do cavalo. Ele era prevenido. Andava sempre
com algumas ferramentas, lanterna e uma arma, para caso de emergência. Entrou
na mina devagar, cortando o mato com um facão. Lá dentro, tudo era escuro e
úmido. Ele acendeu sua lanterna e viu morcegos e coisas esquisitas que corriam à medida que ele entrava. Mas ele só ouvia o barulho da água pingando.
De repente,
já no fundo da mina, com sua lanterna servindo de guia, algo o derrubou e a
lanterna caiu no chão. Ficou tudo escuro. Então ele ouviu uma voz sussurrando
em seu ouvido: – Eu vou te bater.
E ele, que
nada temia, respondeu: – Você é quem sabe. Não tenho medo não!
Nessa hora
bateu um vento gelado. Ele quis levantar, mas alguma coisa não deixou. Ele foi
prensado no chão com força e começou a apanhar como nunca em toda sua vida. Era
murro vindo de todos os lados, pontapés, socos, pancadas na cabeça e pescoção.
Ele gritava e se debatia. Tentava revidar, mas seus murros se perdiam no nada.
Como o lugar era ermo, ninguém podia socorrê-lo.
Depois de
muito apanhar, quase desmaiado, o valentão se arrastou até o lado de fora da
mina. Tinha hematomas espalhados pelo corpo, sangrava pelo nariz e canto da boca e não
sabia dizer quem havia batido nele. Montou com dificuldade no
seu cavalo e disparou para longe daquele lugar.
Foi medicado
e deixou o tempo passar. Já melhor, resolveu sair. Ao vê-lo de olho roxo e tão
maltratado, seus companheiros começaram a caçoar, dizendo que havia aparecido
alguém com coragem suficiente para lhe dar uma merecida surra. Ao que ele
respondeu:
– Pra bater em mim, só se for do outro mundo.
– Pra bater em mim, só se for do outro mundo.
E contou sua malfadada aventura em busca de ouro na mina
abandonada, deixando a todos boquiabertos. E arrematou grave:
– Para
entrar numa mina dessas tem que estar com o espírito preparado, tem que ter o
corpo fechado.
Texto adaptado do livro "Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto", de Angela Leite Xavier.
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Texto adaptado do livro "Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto", de Angela Leite Xavier.
Obs.: Esta postagem foi realizada mediante prévia autorização da autora.
Para mais "causos" e contos de Angela Xavier, acesse o blog dela:
Compartilhando Histórias
Fonte de consulta:
Ouro Preto . Com
Ouro encontrado, ouro escondido
http://www.ouropreto.com.br/secao/historias-de-ouro-preto
Livro : Tesouros, fantasmas e lendas de Ouro Preto
O livro reúne mais de 70 histórias, ambientadas do século XVIII até início do XX, coletadas junto a moradores ou em livros sobre a cidade. Olavo Romano, responsável pelo prefácio, afirma que "Ouro Preto era cheia de fantasmas, uma cidade mal iluminada, repleta de capelas e cemitérios, onde ninguém saia de casa depois das 21 horas. Trata-se de um livro que narra a História de Ouro Preto de uma forma agradável, à maneira dos contadores de histórias, e está entremeada de lendas e causos. Começa chamando a atenção do leitor para a necessidade de se preservar aquilo que faz parte da nossa memória e relata a descoberta do ouro, os conflitos que surgiram no início e as revoltas".
A ênfase do livro é dada às histórias dentro da História, nas curiosidades que os livros de História não relatam, na sociedade que se formou ao redor das minas de ouro com suas crenças, seus valores e sua religiosidade. Relatos de grandes festas, de muitos casos assombrados e tesouros escondidos. A ilustração, com desenhos em bico de pena, é do artista plástico ouro-pretano José Efigênio Pinto Coelho.
Fonte: http://www.livrariaouropreto.com/lancamentos.html
A ênfase do livro é dada às histórias dentro da História, nas curiosidades que os livros de História não relatam, na sociedade que se formou ao redor das minas de ouro com suas crenças, seus valores e sua religiosidade. Relatos de grandes festas, de muitos casos assombrados e tesouros escondidos. A ilustração, com desenhos em bico de pena, é do artista plástico ouro-pretano José Efigênio Pinto Coelho.
Fonte: http://www.livrariaouropreto.com/lancamentos.html
Muito legal os "causos"! Minas Gerais deve estar cheio de histórias sobre tesouros perdidos.É bom a gente conhecer um pouco mais desse Brasil tão vasto e com tantas características peculiares de cada local. Um abração!
ResponderExcluirQue bom que gostou, Regina.
ExcluirOutros causos virão!