sábado, 22 de janeiro de 2022

ArrumAção

Manual de limpeza de um monge budista
Autor: Keisuke Matsumoto

Livro que mostra como os princípios budistas podem ser usados nas tarefas diárias por qualquer pessoa, sem a necessidade de um caráter religioso, como uma referência de atitudes que podem melhorar a eficiência e satisfação de como nos colocamos no mundo.
Mesmo não desejando ou conseguindo manter o nível de excelência proposto pelo livro, acho interessante ter em mente como tarefas corriqueiras podem ser significadas com ações e sensações enriquecedoras.

Com letras espaçadas, textos curtos e muitas ilustrações, a leitura deste livro é rápida e enriquecedora. Dividido em 7 partes, trata da ideia de limpeza, dos utensílios, das áreas internas e externa da casa, terminando com a limpeza do corpo e da alma e considerações sobre atitudes a se observar após a limpeza.
Ótimo livro para se ter e reler esporadicamente. Também um presente útil para pessoas que valorizam a saúde espiritual. 
Compartilho os trechos abaixo como amostra.

Imagem retirada da página 93 do livro
Ilustração: Kikue Tamura

"A limpeza vai além do simples e repetitivo trabalho braçal. [...] Visite um templo budista e perceberá que suas dependências estão sempre impecáveis. Um dos motivos é expressar as boas vindas aos visitantes.Outro motivo é manter a ordem e limpeza do seu interior através da atenção e cuidados com o exterior onde habita. [...] Limpeza não é considerada um estorvo, algo que deve ser concluído o mais rápido possível. Dizem que um dos discípulos de Buda alcançou o nirvana fazendo nada menos do que varrer. Limpar não é o contrário de sujar, é uma prática que conduz ao aperfeiçoamento espiritual."
(Págs. 13 e 14)

"O que é lixo? Aquilo que é velho, inútil? Objetos não nascem lixo, tornam-se quando alguém os desgasta ou quebra, quando passa a enxerga-los nessa condição. [...] Quem não respeita os objetos tampouco respeita as pessoas. Se tudo se tornará inútil e desnecessário em algum momento, então tudo é potencialmente lixo.
Os objetos demandam energia e tempo para serem criados, e carregam em si parte de seus criadores. Ao limpar e organizar sua casa, não os manuseie de forma rude e tenha gratidão.
Por outro lado, isso não é justificativa para acumular objetos sem utilidade. Mesmo velhos, os objetos ainda guardam vida dentro de si e, se os doarmos, eles poderão ser úteis a alguém. [...]
Permita que os objetos que lhe serviram possam exercer suas funções para terceiros – seja-lhes grato e repasse-os. Isso é valorizá-los."
(Págs. 15 e 16)

"Antes de iniciar a faxina, abra as janelas e troque o ar ambiente, purificando-o com a brisa de fora. [...]
Na primavera e no outono os dias são agradáveis e o vento prazeroso. O ar quente do verão e gélido do inverno também são bons. O ato da limpeza nos possibilita comunicar com a natureza. [...]
O ser humano é frágil e incapaz de sobreviver na natureza selvagem. Impossibilitado de se colocar desprotegido, ele precisa criar ambientes artificiais habitáveis. [...]
Abra as janelas e conviva com a natureza, consciente da fraqueza inerente que nos impossibilita coabitar com as criaturas selvagens. Sinta a gentileza e agressividade da natureza, grato pela insustentável força da vida.
Todas as manhãs, abra as janelas e dê boas-vindas ao ar puro."
(Págs. 19 e 20)

"Não lamente o ontem e não anseie o amanhã. Concentre as energias no agora.
O ser humano moderno, sempre ocupado, volta para casa exauridoe só deseja relaxar no banho, jantar e dormir. Na manhã seguinte acorda com o ônus do dia anterior – louça suja, roupa para lavar, cômodos empoeirados.
Bagunçou? Arrume imediatamente! Não deixe as sementes da preguiça e da ruína germinarem em sua mente. Se negligenciada, a sujeira do espírito se torna difícil de remover. Não adie e viva cada dia de forma plena e agradável, o mais próximo possível do seu ideal."
(Págs. 27 e 28)

"A cozinha do templo sempre se encontra impecavelmente limpa, e seus utensílios nos lugares adequados. Uma cozinha organizada permite começar imediatamente o trabalho, com satisfação. A cozinha é onde os alimentos se transformam em energia de vida, portanto um local de atenção e reverência. Enquanto na cozinha, se concentre nos detalhes no manuseio dos alimentos e objetos. Optar pela conveniência de manter abertas portas de armários é sinal de que o espírito está preguiçoso ou desorientado. Feche a porta dos armários toda vez que retirar algo. Isso previne acúmulo de poeira, possíveis encontrões e a lassidão espiritual. [...]
Os alimentos são seres vivos sacrificados para que mantenhamos nossa vida. Evitar desperdícios no preparo e comer apenas a quantidade necessária ao bem estar são sinais de gratidão e respeito pelo conceito de vida em geral, afirmando que nossa vida não vale mais do que outras e todas estão interligadas."
(Pág. 52)
                                          
"Nos templos, é investida grande quantidade de energia à limpeza do banheiro. [...]Não há aposento que melhor represente a casa do que o banheiro. Caso precise utilizá-lo,o convidado ficará sozinho num ambiente onde sua atenção se voltará para os detalhes. Sujeira no assento, poeira no chão, papel higiênico quase no fim: se o ambiente estiver negligenciado, a impressão da casa como um todo e do anfitrião se comprometem. [...]
Banheiros são os locais onde purificamos nossos corpos, de modo que sua limpeza deve ser absoluta. Num ambiente imaculado, as pessoas sentem-se impelidas a conservá-lo assim, demonstrando, ainda, preocupação com o próximo."
(Págs. 57 a 59)

"Ignorância é ausência de luz, o estado de vagar a esmo na escuridão. O fato de a verdade ser invisível fertiliza o surgimento das paixões e dos desejos mundanos, cujo resultado é o sofrimento. O que destrói a ignorância é a sabedoria. [...] Ser iluminado com a luz da sabedoria é finalmente se libertar.
Limpe as luminárias como se polisse a fonte de luz da sabedoria, que elimina a ignorância e os pensamentos impuros."
(Pág. 112)

"O jardim é o local onde nos comunicamos com a natureza. Embora seja impossível vivermos nela, é impossível sobreviver sem. O jardim se torna o lugar em que aprofundamos o conhecimento sobre esse delicado equilíbrio. Há templos que fazem do jardim uma metáfora da natureza, outros optam por representar a Terra pura.
O modo como enxergamos o jardim reflete nosso espírito no momento. Sujeito ao clima e estações, o jardim é efêmero. [...] O jardim é uma área de comunicação entre o homem e a natureza. [...]
Evite o uso de herbicidas. Eles influenciam na qualidade do solo e prejudicam minhocas e outros animais. Cuidar do jardim é estar atento a todos os seus componentes. As formas de vida estão conectadas. No diálogo com a natureza, nosso espírito se enriquece. Observe-a e, assim, observará sua alma."
(Págs. 121 a 123)

"Os vidros simbolizam transparência e desapego. Caso estejam embaçados ou com marcas de dedos, o espírito se encontra igualmente maculado.
O budismo reitera a importância de eliminar a visão nublada pelo egoísmo e enxergar a essência das coisas, aceitando-as como elas são. Faça isso com naturalidade e você alcançará o estado mental da compreensão.
Esfregue os vidros das janelas até ficarem límpidos e você consiga contemplar a paisagem além, esquecendo-se de sua própria existência.
Limpe até não restar sequer um ponto turvo."
(Pág. 125)

"Acredita-se que liberdade é fazer o que se quer na hora em que se deseja. Porém, a liberdade, de fato, é viver em paz, com o coração pleno de felicidade. E isso se obtém somando cada uma de nossas ações. O tempo dedicado à limpeza, por exemplo, traz uma sensação de plenitude que se estende durante a permanência no ambiente."
(Pág. 170)

Textos adaptados retirados do livro
Manual de limpeza de um monge budista
(Keisuke Matsumoto)
São Paulo: Editora Planeta, 2015.


Segundo o budismo, fazer faxina significa remover a sujeira do espírito e dos hábitos cotidianos. É por isso que o dia dos monges começa com a limpeza. Neste livro, o monge Keisuke Matsumoto ensina como cuidar da casa pode tornar nossa vida melhor e mais íntegra. São dicas simples e práticas, seguidas de referências filosóficas. Baseando-se nos princípios do budismo, o tempo dedicado à limpeza pode trazer uma sensação de contato com o presente e consigo, levando à plenitude. Vale a pena tentar.

4 comentários:

  1. Quão interessante, Sylvio! Nunca havia ouvido falar disso! Que notável aproximação filosófica ao dia a dia! Que grandes máximas! Obrigado!

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    1. Acredito que não precisamos ter rotinas extravagantes ou estarmos em lugares exóticos para tornar nossa vivência algo empolgante e produtivo. As viagens internas são mais acessíveis e edificantes, e podem ser realizadas quando e onde nos dispomos!

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  2. Achei bem interessantes os princípios, pois creio que nossa casa (independentemente de ser rica ou pobre) reflete em sua (des)organização um pouco do que somos. Eu sou muito exigente comigo mesma, por isso o ambiente que me cerca precisa, necessariamente, estar organizado.
    Salvei a foto do livro, pois vai entrar na lista de aquisições. Obrigada por compartilhar!

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    1. O que eu gostei neste livro é a correspondência entre a manutenção física e a espiritual, algo que eu não havia concebido até então.
      Daí minha intenção nessa postagem é divulgar este conceito, para que seja inspirador e útil para outras pessoas.

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