No laboratório de novas armas e táticas que se tornou a Primeira Guerra Mundial, a guerra química aconteceu como consequência do impasse surgido a partir da guerra estática e defensiva das trincheiras, onde os avanços da tecnologia militar fizeram com que o poder defensivo das tropas entrincheiradas se tornasse superior à capacidade ofensiva, impossibilitando vitórias decisivas dos atacantes.
Como ataques
diretos dificilmente conseguiam conquistar o terreno onde o inimigo estava
entrincheirado ou conseguiam a um grande custo de vidas, era necessário
desenvolver novas estratégias e armas para obrigar a saída dos inimigos de suas
trincheiras. Os ingleses desenvolveram os tanques secretamente, enquanto os
alemães se dedicaram ao desenvolvimento do gás cloro (CI2) e do
lança-chamas portátil.
O gás cloro
foi proposto como arma pelo cientista alemão Fritz Harber, Prêmio Nobel de Química de 1912, e usado pela primeira vez às 17:30 horas de 22 de abril de
1915, pelos alemães, no início da Segunda Batalha de Ypres, na Bélgica.
Depois de um
intenso bombardeio da artilharia, 168 toneladas de gás cloro foram lançadas de
5.730 cilindros situados próximos às trincheiras alemãs e, levados pelos
ventos, atingiram os 15 mil franceses e canadenses que defendiam a pequena
cidade belga de Ypres, matando 5 mil em dez minutos pelo efeito asfixiante do
gás e incapacitando temporariamente 7 mil. Outros 2 mil militares foram
capturados pelos alemães.
As primeiras
vítimas do gás, os argelinos que lutavam com os franceses, recuaram
cambaleantes da linha de combate, tossindo e apontando para a garganta, após
serem atingidos pela nuvem cinza-esverdeada do gás cloro, que se transformava
numa nuvem branca com nuances azuladas à medida que se deslocava pelas tropas
que, em pânico, abandonaram as posições defensivas e recuaram
desorganizadamente.
Com o uso do
gás, a Alemanha infringia a Convenção Internacional de 1889, que proibia o
emprego de substâncias tóxicas como armas militares.
Logo após
este ataque alemão, a França e a Inglaterra começaram a desenvolver suas
próprias armas químicas e máscaras de gás, que passaram a ser acessório
obrigatório para os soldados desde então, sendo adaptadas também, em menor
quantidade, para cavalos e cães.
Ataques de gás eram realizados muitas vezes em noites e manhãs com
neblina, para disfarçar a chegada da nuvem tóxica. Os vigias de ambos os lados
passaram a fazer seus turnos sempre equipados com máscaras e, se possível,
próximos a gaiolas onde ficavam presos pássaros, camundongos e ratos, por conta
de ataques com o gás fosgênio, que era incolor e inodor, impossível de ser
percebido até que começasse a causar sufocação e queimadura nas mucosas. Diante
de sinais de intenso sofrimento e morte dos animais nas gaiolas, o vigia
acionava o sinal de ataque de gás e todos na área, inclusive as tropas de
reserva em seus alojamentos, colocavam suas máscaras até que fosse verificado
se o ar estava ou não contaminado.
Vigia alemão fazendo bolas de neve (para passar o tempo) durante rigoroso inverno
As armas
químicas usadas na Primeira Guerra Mundial foram:
• Gases tóxicos (lançados primeiramente
partindo de cilindros utilizando o vento para direcionar a nuvem química, a partir de 1916 ambos os lados passaram a utilizar projéteis de artilharia e morteiros, além de bombas dos aviões em pequena escala);
• Lança-chamas.
Nenhum
dos lados ganhou a guerra pelo uso de armas químicas, mas estas fizeram a vida
nas trincheiras ainda mais tensa e desagradável, tornando-se um dos mais
temidos e lembrados horrores da guerra.
O uso de gás
venenoso, realizado pelos principais participantes durante a Primeira Guerra
Mundial, constituiu crime de guerra, violando as convenções e tratados da
Declaração de Haia de 1899 relativo a gases asfixiantes, e a Convenção de Haia
de 1907 sobre guerra terrestre, que proibiam o uso em guerras de projéteis
contendo gás venenoso ou asfixiante. Como ambos os lados incorreram no mesmo crime, após a guerra nenhum político ou militar foi responsabilizado pelas
mortes e danos causados aos civis e suas propriedades pelo uso de armas
químicas.
Parte dos 600 militares italianos mortos por ataque alemão com gás fosgênio
Caporetto ( Itália ) - 1917
Os gases tóxicos usados durante a
Primeira Guerra Mundial
Os gases mais utilizados foram o lacrimogêneo, cloro, fosgênio e mostarda.
Gás Lacrimogêneo
Os efeitos da
exposição ao gás lacrimogêneo são reações de lacrimação com temporária
dificuldade de visualização, irritação das mucosas dos olhos, nariz, boca e
pulmões, fazendo a pessoa chorar, tossir e espirrar.
Sensação de
insuficiência respiratória, coceiras e dor de cabeça são os efeitos mais comuns.
A exposição prolongada a altas concentrações do lacrimogêneo pode
ser fatal.
Gás Cloro
O gás cloro é
asfixiante, provocando irritação e ressecamento nas vias respiratórias,
forçando os pulmões a produzir fluidos que matam a vítima por afogamento se
inalado por tempo prolongado, sendo necessária a inalação de oxigênio líquido e
até uma traqueotomia (corte na parte da frente do pescoço e na traqueia para
permitir a chegada de ar aos pulmões) para normalizar a respiração – manobras
impossíveis em grande escala nos campos de batalha.
Gás Fosgênio
As
deficiências do gás de cloro foram superadas com a introdução do gás fosgênio, que
foi elaborado por um grupo de químicos franceses liderados por Victor Grignard
e usado pela primeira vez pela França em 1915. Incolor e com um odor
comparado a "feno mofado", o gás fosgênio é difícil de detectar,
tornando-se uma arma eficaz. Embora o fosgênio tenha sido usado às vezes por
conta própria, foi mais utilizado misturado com um volume igual de cloro, que
ajudava o fosgênio a espalhar-se de modo mais denso.
O fosgênio é um agente mais mortal do que o cloro. Causa fortes dores de cabeça, tosse, irritação nos olhos com lacrimação e temporária dificuldade de visualização, queimaduras e corrosão nas membranas do sistema respiratório, matando por asfixia devido ao inchaço interno das vias respiratórias se inalado em grande quantidade.
Ele tinha uma
potencial desvantagem na medida em que alguns dos sintomas de exposição levavam
24 horas ou mais para se manifestar. Isso significava que as vítimas eram
inicialmente capazes de continuar a combater. A desvantagem inicial era
compensada com um maior número de baixas após este período, uma vez que muitos
não se protegiam com máscaras por não se sentirem ameaçados enquanto inalavam o gás sem perceber.
Gás Mostarda
O gás mais
amplamente relatado da Primeira Guerra Mundial foi o gás mostarda, vesicante
(que faz nascer bolhas na pele) inventado pelos ingleses na década de 1820 e introduzido na guerra pela Alemanha em julho de 1917, antes da Terceira Batalha de Ypres, na Bélgica.
Os alemães marcaram seus projéteis de artilharia com amarelo para o gás
mostarda e verde para o cloro e fosgênio.
O gás
mostarda não é um agente assassinato muito eficaz (embora seja fatal em doses
elevadas), mas era usado para poluir o campo de batalha e diminuir a eficiência
do inimigo. Lançado em projéteis de artilharia e às vezes em bombardeios
aéreos, por ser mais pesado do que o ar, o gás mostarda se estabelece no chão
como um líquido oleoso e permanece ativo durante vários dias ou semanas,
chegando a meses, dependendo das condições do tempo.
O receio ao gás mostarda era grande porque, em grandes concentrações, ele era capaz de atravessar o tecidos das fardas e atingir a pele. Tal situação se agravava em ataques durante a chuva, pois o tecido molhado absorvia mais rapidamente e mantinha impregnado por mais tempo os agentes químicos do gás. A melhor forma de proteger a pele era cobrindo as mãos com luvas e o corpo com o capote para chuva, nem sempre disponíveis por estarem longe nos alojamentos, enquanto se estava como vigia nas trincheiras da frente. Mesmo quando era possível colocar tais roupas, havia o inconveniente dos longos períodos necessários para livrar a roupa dos resíduos, entre diversas lavagens e períodos de exposição ao sol para tirar a química do tecido. Neste meio tempo, muitas vezes não havia luvas e capotes adicionais para todos (já que o número de roupas contaminadas era de centenas ou milhares de pessoas a cada ataque químico) e o militar tinha que enfrentar as baixas temperaturas do inverno (com neve) sem luvas e as chuvas sem um capote ou tendo um emprestado somente durante os períodos de vigia.
A natureza
poluente do gás mostarda nem sempre o tornava adequado para apoiar um ataque de
infantaria, pois as tropas que o lançavam também ficavam expostas aos
prolongados efeitos do gás em suas roupas quando avançavam.
O gás mostarda causa
vômitos, cegueira temporária devido a queimaduras da membrana ocular e a pele
das vítimas cria bolhas de queimadura. O gás causa hemorragia interna
e externa, queimando a membrana mucosa, atacando os brônquios e o revestimento
das vias respiratórias, provocando feridas e inchaço. Vítimas de exposição ao
gás mostarda levavam quatro ou cinco semanas para morrer, ao longo de um
doloroso processo de insuficiência respiratória. As queimaduras nos olhos
também eram muito dolorosas.
A enfermeira
inglesa Vera Mary Brittain descreveu o envenenamento por gás
mostarda: "Eu gostaria que as pessoas que falam sobre ganhar esta
guerra custe o que custar pudessem ver os soldados sofrendo de envenenamento
por gás mostarda! Grandes bolhas cor de mostarda surgem ao longo do corpo e os
olhos dos cegos ficam com as pálpebras pegajosas e presas juntas. Homens lutando para
respirar, com as vozes de um mero sussurro, dizendo que suas gargantas estão
fechando e eles vão engasgar e morrer sem ar".
Os franceses
usaram Cianeto de Hidrogênio e Ácido Prússico, conhecidos como “gases do
sangue” porque quando inalados suas moléculas se unem à hemoglobina,
impossibilitando que o oxigênio seja transportado para as células do corpo,
cansando morte por falta de oxigênio no cérebro.
Em 1918 os
Estados Unidos começaram a produção em grande escala de um gás vesicante (causa
bolhas na pele) melhorado conhecido como Lewisite, para uso em uma ofensiva
planejada para o início de 1919. Até o momento do armistício, em 11 de novembro
de 1918, uma fábrica perto de Willoughby (Ohio, EUA) estava produzindo 10
toneladas por dia da substância, para um total de cerca de 150 toneladas.
Em
contato com a pele, o gás lewisite provoca grandes bolhas dolorosas, especialmente
nas mãos e pé, costas e região genital. Ele também atua como um irritante para
o pulmão, causando inchaço tóxico, inflamação e destruição do revestimento das
vias aéreas, causando o desprendimento de seu interior, tornando difícil a
respiração. Este gás é um veneno sistêmico porque a absorção de arsênico
através da pele provoca inchaço pulmonar, diarreia, agitação, fraqueza,
temperatura abaixo do normal e pressão arterial baixa. A vítima sente os seus
efeitos imediatamente e pode ser fatal em menos de dez minutos, quando inalado
em altas concentrações.
O lewisite pode ser lançado na forma de vapor, aerossol ou líquida, sendo mais prejudicial em condições de baixa temperatura ou de baixa umidade. Seus efeitos são persistentes, com duração de até oito horas em ambiente ensolarado
e ainda mais prolongado em climas frios e secos. O vapor do veneno é cerca de
sete vezes mais pesado que o ar, penetrando pelo chão em trincheiras, abrigos subterrâneos e esgoto.
Soldado canadense com queimaduras de gás mostarda
Agentes químicos utilizados na 1ª Guerra Mundial
Nome
|
Efeitos
|
Usado por
|
Primeiro uso
|
Observações
|
Cloro
|
Corrosivo e tóxico.
Irrita o sistema respiratório.
|
Ambos
|
1914
|
Primeiro agente utilizado.
|
Brometo de Xilila
(Brometo de metilbenzeno).
|
Altamente tóxico, irritante e
lacrimogêneo.
|
Ambos
|
1915
|
Primeiro grande uso pelos
alemães,
na batalha de Bolimów (Rússia).
|
Fosgênio
|
Venenoso e corrosivo. Altamente
tóxico, interrompe as trocas gasosas alveolares e irrita pele e membranas.
|
Ambos
|
1915
|
Gás incolor e quase inodoro,
demora para agir.
|
Brometo de benzila
|
Fortemente lacrimogêneo.
Irrita
pele e mucosas.
|
Eixo
|
1915
|
Líquido incolor.
|
Clorometil cloroformato
|
Lacrimogêneo, causa cegueira
temporária. Irritante também à pele e aos pulmões.
|
Ambos
|
1915
|
Líquido incolor.
|
Triclorometil cloroformato
(Difosgênio)
|
Altamente irritante. Causa
queimaduras.
|
Ambos
|
1916
|
Líquido incolor. Seus vapores
destruíam os filtros das máscaras da época.
|
Cloropicrina
|
Altamente tóxico e
lacrimogêneo. Concentrações maiores causam edema pulmonar.
|
Ambos
|
1916
|
Inicialmente foi devastador
para os aliados.
|
Tetracloreto de estanho
|
Causa queimaduras. Altamente
irritante, mas não letal.
|
Aliados
|
1916
|
Líquido incolor, forma fumaça
em contato com o ar.
|
Lodoacetato de etila.
|
Tóxico, corrosivo e
lacrimogênio.
|
Aliados
|
1916
|
Líquido.
|
Bromoacetona
|
Tóxico e lacrimogêneo.
|
Ambos
|
1916
|
-
|
Monobromometil etil cetona
|
Irritante e lacrimogêneo.
|
Eixo
|
1916
|
-
|
Acreolina
|
Tóxico, lacrimogêneo e
fortemente irritante aos olhos, pele e narinas.
|
Aliados
|
1916
|
Líquido incolor com odor acre e
desagradável.
|
Cianeto de hidrogênio (Ácido Prússico)
|
Venenoso e asfixiante. Bloqueia
uma enzima mitocondrial e, consequentemente, a respiração celular. Uma
concentração de 300 mg/m3 no ar mata um humano em 10 min.
|
Aliados
|
1916
|
Também foi usado nos campos de
extermínio nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
|
Sulfeto de hidrogênio (Hidrogênio
sulfurado)
|
Venenoso, ataca diferentes
sistemas do corpo humano, apesar de afetar o sistema nervoso com maior
intensidade. Toxicidade comparável à do Cianeto de hidrogênio.
|
Aliados
|
1916
|
Gás incolor inflamável, com
odor característico de ovos podres.
|
Difenilaminoclorarsina (DM)
|
Causa irritação ao trato
respiratório superior (faz a vítima espirrar). Efeito prolongado.
|
Eixo
|
1917
|
Cristais amarelos ou
esverdeados. Possui arsênio na composição. Usada em espécies de
"velas" que, quando acesas, espantavam o inimigo.
|
A-clorotolueno
(Cloreto de benzila)
|
Irritante e lacrimogêneo.
Volátil, atinge facilmente as mucosas, onde se hidroliza produzindo ácido
clorídrico.
|
Eixo
|
1917
|
Líquido incolor altamente
volátil e reativo.
|
Gás mostarda - Sulfeto de
bis (2-cloroetil)
|
Fortemente vesicante (causa
irritação e dor extremas a mucosas, à pele e aos olhos, produzindo bolhas).
Irrita os pulmões. Mutagênico e cancerígeno.
|
Ambos
|
1917
|
Coloração amarelo-marrom (semelhante
a dos grãos de mostarda).
|
Éter diclorometílico
|
Irritante, embaça a visão.
Exposição prolongada pode causar câncer de pulmão.
|
Eixo
|
1918
|
Líquido incolor.
|
Etildicloroarsina
|
Altamente tóxico e vesicante,
causa bolhas.
|
Eixo
|
1918
|
Líquido incolor volátil. Outro
derivado do arsênio.
|
N-Etilcarbazol
|
Irritante da pele e dos olhos.
|
Eixo
|
1918
|
-
|
Fonte do quadro:
Aspirações Químicas
Armas Químicas: 1ª Guerra Mundial
Obs.: Países
que usaram armas químicas:
Eixo: Alemanha
e Áustria-Hungria.
Aliados:
França, Inglaterra, Canadá e Estados Unidos.
Tropa estadunidense sob ataque de gás
Sistemas de distribuição
do gás
Cilindros
O primeiro sistema utilizado para a
liberação em massa de gás usava cilindros de gás com vento favorável para levar
o produto às trincheiras do inimigo. A principal vantagem deste método é que
era relativamente simples e, em condições atmosféricas adequadas, produzida uma
nuvem concentrada capaz de superar as defesas das máscaras de gás.
As desvantagens de lançamentos a
partir de cilindros eram inúmeras. Em primeiro lugar, a entrega dependia do
vento, podendo a nuvem tóxica ser levada para longe do inimigo ou retornar
contra a própria tropa. Nuvens de gás eram visíveis, permitindo tempo ao
inimigo para proteger-se. As nuvens de gás tinham penetração limitada, sendo
capazes de afetar apenas as trincheiras da linha de frente antes de se
dissipar. Havia sempre cilindros que apresentavam alguma obstrução na hora de
liberar o gás, diminuindo a capacidade da ofensiva e oferecendo transtornos
logísticos posteriores para sua identificação e manuseio. Os cilindros tinham que ser
colocados em frente do sistema de suas próprias trincheiras para lançar o gás sobre o alvo, oferecendo risco de serem atingidos por
bombardeamento inimigo, rompendo prematuramente seu conteúdo sobre a própria
tropa. Cilindros com vazamento poderiam emitir um fio indicador de gás que atraiam o fogo da artilharia inimiga.
Outra desvantagem era o grande volume e peso a serem transportados. Um
cilindro de cloro britânico pesava 86 kg, dos quais apenas 27 kg era o gás de
cloro, sendo necessário dois homens para seu transporte. Gás fosgênio foi
introduzido mais tarde em cilindros que pesavam apenas 23 kg cada.
Ataque de gás alemão contra russos na Frente Oriental
Fotografia feita por aviador russo ( 31 de dezembro de 1915 )
Artilharia
Os ataques com gás através da artilharia
superaram muitos dos riscos de lidar com o gás em cilindros. Projéteis de
artilharia com gás eram independentes do vento e aumentaram o alcance efetivo
de gás, tornando vulnerável qualquer lugar dentro do alcance das armas ao longo de dezenas de quilômetros, e não mais apenas as posições mais próximas ao inimigo.
O gás
da artilharia podia ser entregue sem aviso, especialmente o fosgênio, incolor e quase inodoro. Há inúmeros relatos de bombas de gás colidindo no chão com um som seco
em vez de explodir que foram inicialmente descartadas como tiros falhados ou
estilhaço de artilharia, dando tempo para o gás agir antes que os
militares percebessem ser uma arma química e tomassem as devidas precauções.
A principal deficiência do ataque
com gás através de artilharia foi a dificuldade de obtenção de uma concentração
capaz de matar. Cada projétil era capaz de levar apenas uma pequena carga de
gás e uma área tinha que ser submetida a um bombardeamento de saturação com centenas de bombas para
produzir uma nuvem com capacidade de causar grandes danos. O gás mostarda, no
entanto, não tinha necessidade de formar uma nuvem concentrada uma vez que
impregnava o solo com uma camada química e, portanto, a artilharia foi o
veículo ideal para a entrega deste poluente no campo de batalha.
Ataque da artilharia alemã contra tropas francesas
Trincheiras do Fort de la Pompelle - Reims ( França )
Projetor
de gás
A solução para criar uma
concentração letal de gás que não fosse liberada a partir de cilindros
posicionados próximos às próprias posições foi o projetor de gás, um tubo
fixado numa escavação na terra ou numa estrutura de argamassa. Dentro do tubo
era inserida uma pequena carga explosiva para projetar todo o cilindro com gás
como um míssil sobre o inimigo. Ao ser
projetado, uma pequena corda fixa segurava o lacre do cilindro, que liberava a
válvula com o gás durante o voo, caindo em terreno inimigo já liberando seu conteúdo.
Ambos os lados desenvolveram
diferentes tipos de projetores de gás. O capitão britânico William Howard Livens criou em
1917 um dispositivo simples e eficiente: um tubo com 25 cm de diâmetro afundado no chão no ângulo desejado, onde um propulsor era aceso por
um sinal elétrico, disparando por até 1900 metros o cilindro contendo 14 ou 18
kg de gás. Com uma bateria de diversos destes projetores disparando
simultaneamente, uma densa concentração de gás podia ser conseguida. Os
projetores Livens foram usados pelos ingleses pela primeira vez em Arras, na
França, em 4 de abril de 1917. Em 31 de março de 1918 os britânicos realizaram
seu maior ataque com projetores de gás, lançando 3.728 cilindros sobre os
alemães em Lens, na França.
Os alemães e franceses também desenvolveram seus modelos de projetores de cilindros com gás.
Ingleses carregando um Projetor Livens para cilindros de gás
A evolução da guerra química durante a
1ª Guerra Mundial
Ao longo da Primeira Guerra Mundial, diferentes tipos de gases foram pesquisados e usados
pelos alemães e aliados. Foram utilizados para desmoralizar, ferir e matar os
inimigos. Em alguns casos era mais interessante ferir grande quantidade de
combatentes do que matá-los, pois os cuidados com os feridos implicava na
mobilização de maior quantidade de recursos materiais e humanos do que o
necessário com os mortos, desgastando a logística inimiga. Além das
queimaduras, imagine as consequências em um complexo de trincheiras atingido
por gases que causassem vômito e diarreia em centenas de pessoas
simultaneamente...
Inicialmente liberados a partir de cilindros localizados à frente das
próprias trincheiras, utilizando o vento para levar os gases tóxicos em direção
ao inimigo, os produtos químicos foram introduzidos nos projéteis de artilharia e bombas da aviação para garantir ataques mais oportunos e localizados. Apesar
de causar menos baixas, por ter uma concentração menor do que as nuvens
lançadas dos cilindros, o uso simultâneo ou alternado de bombardeio
convencional e químico causava impacto no moral da tropa atacada, com perda de
tempo na colocação dos equipamentos de proteção e diminuição da capacidade de
visão e comunicação entre os combatentes usando máscaras contra gás, além do
tempo gasto após o ataque para verificação da qualidade do ar e descontaminação
dos locais atingidos, diminuindo o tempo de descanso da tropa. Bastava algumas poucas bombas com
produtos químicos em meio a dezenas de explosões convencionais para iniciar um longo e desgastante protocolo de procedimentos
de proteção. Usando esta estratégia com frequência
conseguia-se aumentar o estresse emocional e físico no inimigo em determinadas
regiões.
Cilindros de gás lançados sobre o inimigo com projetores permitiram fortes concentrações químicas sem a necessidade da dependência do vento e sem o alarde de um ataque de artilharia, por isso foram realizados muitos ataques químicos deste tipo durante as madrugadas, para contaminar o maior número possível de pessoas dormindo antes que o alarme de ataque de gás fosse acionado.
Tornou-se comum usar mais de um tipo de produto químico em um mesmo ataque, para misturar os efeitos e causar diferentes agressões ao organismo, com o objetivo de dificultar o diagnóstico e posterior tratamento das vítimas.
Alemães improvisam máscara de gás para cavalo
O gás cloro
mostrou-se menos eficaz como arma do que os alemães esperavam,
especialmente depois que foram introduzidas contramedidas simples.
Imediatamente após o uso de gás de cloro pelos alemães, instruções foram
enviadas para as tropas britânicas e francesas para prender lenços ou panos
molhados sobre suas bocas.
Tanto os
alemães quanto os aliados inicialmente passaram a ter em seu equipamento improvisadas
proteções de pequenas compressas de gaze, algodão ou flanela e garrafas de
bicarbonato para embeber estas compressas e levá-las à boca.
Pesquisas desenvolveram rudimentares máscaras de proteção e foram testadas
constantes variações de modelos e produtos químicos para filtro, tornando as
máscaras cada vez mais especializadas e eficientes, ao ponto de praticamente anular as vantagens da guerra química.
Alemães com diferentes modelos de máscaras contra gás
Com a proteção de máscaras continuamente aprimoradas e prevenção através de eficientes produtos químicos e estratégias, o gás nunca repetiu o dramático sucesso de 22 de abril de 1915, no entanto, se tornou uma arma que, combinada com a artilharia convencional, foi usada para apoiar a maioria dos grandes ataques nas fases posteriores da guerra. Gás foi empregado principalmente na estática Frente Ocidental, onde o confinado sistema de trincheiras era ideal para alcançar uma concentração eficaz. A Alemanha também usou gás contra a Rússia na Frente Oriental, onde a falta de medidas eficazes resultou na morte de mais de 56.000 russos, enquanto a Inglaterra usou gás na Palestina durante a Segunda Batalha de Gaza. A Rússia começou a fabricação de gás de cloro em 1916, produzindo também fosgênio no final do mesmo ano, no entanto, a maior parte do gás fabricado nunca foi usada.
O exército
britânico acreditava que era necessário o uso de gás, mas só usou gás mostarda
em novembro de 1917, em Cambrai (norte da França), utilizando um estoque
alemão de projéteis de artilharia com gás mostarda capturado. Os ingleses levaram mais de
um ano para desenvolver a seu próprio gás mostarda, que foi usado pela
primeira vez em setembro de 1918, durante a quebra da Linha Hindenburg na
Ofensiva dos Cem Dias.
Entre 1917 e
1918 os aliados realizaram mais ataques com gás do que os alemães, por causa de
um acentuado aumento na produção de gás das nações aliadas. A Alemanha investiu
na criação de novos gases para uso no campo de batalha, mas não foi capaz de
acompanhar o ritmo da quantidade dos aliados na produção de gases mais baratos.
A entrada dos Estados Unidos na guerra permitiu aos aliados aumentar a produção
de gás mostarda muito mais do que a Alemanha. Além disso, o predominante vento
na Frente Ocidental era do oeste, o que significava que os aliados tinham
condições favoráveis com mais frequência para uma liberação de gás do que os
alemães.
Cão e cabo francês usando máscara para gás - 1916
( Ao fundo retirada de vítima de ataque químico )
Principais confrontos com uso de armas
químicas durante a Primeira Guerra Mundial
• Agosto de 1914 – Os franceses
empregam gás pela primeira vez durante a Primeira Guerra Mundial usando gás
lacrimogêneo (Bromoacetato de etilo) em projéteis de artilharia. A quantidade
usada foi tão pequena que o produto nem foi notado pelos alemães.
• Outubro de 1914 – Os alemães lançam
projéteis de fragmentação de artilharia com gás lacrimogêneo contra os ingleses
em Neuve Chapelle, na França. A concentração usada foi baixa e os
efeitos mal foram notados pelos ingleses.
• 31 de janeiro de 1915 – A Alemanha usa
gás em larga escala como arma pela primeira vez ao disparar 18 mil projéteis de
artilharia contendo gás lacrimogêneo líquido (Brometo xylyl) em posições russas
no rio Rawka, a oeste de Varsóvia, durante a Batalha de Bolimov. Em vez de
vaporizar, o líquido congelou devido ao frio e causou poucos efeitos sobre os
russos.
• 22 de abril de 1915 – A Alemanha lança
168 toneladas de gás cloro a partir de 5.730 cilindros contra franceses e
canadenses na cidade belga de Ypres. O gás se arrastou lentamente em direção às
trincheiras aliadas com a ajuda de um vento suave, matando 5 mil homens em dez
minutos e capturando 2 mil. 7 mil homens são incapacitando temporariamente e
abandonam suas trincheiras, abrindo uma lacuna de 7 Km nas defesas aliadas, mas
o ataque alemão é detido pelos franceses.
Ainda durante
a Segunda Batalha de Ypres, os alemães usam gás cloro, em menor quantidade, em
mais três ocasiões: em 24 de abril contra a 1 ª Divisão canadense, em 02 de
maio contra a 3ª Brigada canadense e em 5 de maio contra os britânicos no
monte Hill 60. As baixas e efeitos são menos impactantes, não influenciando no
resultado das batalhas.
• 30 de julho de 1915 – Os alemães usam lança-chamas pela primeira vez na guerra num ataque conjunto com a infantaria contra trincheiras inglesas em Hoogles (Bélgica), aproveitando-se do fato da distância entre as trincheiras na região serem pequenas. Muitos britânicos saem em pânico das trincheiras e são mortos por tiros de fuzil e metralhadora, mas os ingleses resistem e não há conquista ou perda de terreno.
• 06 de agosto de 1915 – Tropas alemãs
usam gás cloro contra tropas russas que defendem a Fortaleza de Osowiec. Reforços russos vindos da retaguarda juntam-se aos defensores sobreviventes e realizam contra-ataque, mantendo a fortaleza.
• Agosto de 1915 – A Alemanha lança 220
toneladas gás fosgênio a partir de cilindros contra os russos, em dois ataques à
região de Rawka, ao sul de Varsóvia. No primeiro ataque os alemães abrem uma
brecha de 12 Km nas defesas russas, mas recuam diante de contra-ataque. No
segundo ataque o vento muda de direção, jogando a nuvem tóxica contra os
alemães. Os alemães atacavam usando máscaras de gás e não sofreram efeitos
químicos, mas tiveram a visão prejudicada pela nuvem tóxica e os russos, não
afetados pelo gás, realizam eficiente defesa.
O exército
russo tem 9.000 vítimas, com mais de 1.000 mortes. A Rússia organiza equipe
para estudar a utilização de gás venenoso em seus projéteis de artilharia.
• 25 de setembro de 1915 – O primeiro
uso do gás pelos britânicos ocorre na Batalha de Loos e foi um desastre. 140
toneladas de gás de cloro foram utilizadas dispostas em 5.100 cilindros e o
ataque dependia do vento favorável. Na ocasião o vento mostrou-se inconstante e
o gás lançado ou permaneceu na Terra de Ninguém ou, em alguns lugares, soprou
de volta para as trincheiras britânicas.
Além disso,
vários cilindros não liberaram o gás porque chaves de viragem erradas foram
enviadas com eles, impossibilitando seu acionamento. Um bombardeio alemão de artilharia,
realizado como retaliação após o ataque com gás, atingiu alguns desses cilindros
cheios não utilizados, liberando mais gás entre as tropas britânicas. Agravando
a situação, as primitivas máscaras de gás feitas com flanela e distribuídas aos
britânicos eram quentes e os pequenos visores para olhos embaçaram muito. Sem
visibilidade e sufocados, muitos retiraram as máscaras para obter um pouco de
ar fresco ou para tentar melhorar a visibilidade das viseiras, e tiveram a pele
do rosto queimada pelo gás.
• 19 de dezembro de 1915 – A Alemanha introduz na guerra o gás fosgênio, lançando 88 toneladas de gás fosgênio combinado com cloro a partir de cilindros
contra as tropas britânicas em Wieltje, perto de Ypres, na Bélgica. 1.069
militares são vitimados causando 69 mortes. O número de mortes foi baixo devido
ao fato das máscaras contra gás britânicas estarem impregnadas com Fenolato de
sódio, produto eficaz contra o fosgênio. A partir de janeiro de 1916 as
máscaras britânicas seriam impregnadas com Hexamine fenato e Hexametilenotetramina (Urotropina) para melhorar a proteção contra o fosgênio.
• 21 de fevereiro de 1916 - Os alemães
utilizam o lança-chamas durante o primeiro dia da
Batalha de Verdun para atacar as trincheiras francesas que defendiam a cidade de Verdun.
Novas tropas especiais (Stosstruppen)
seguiam com lança-chamas acompanhados pela infantaria equipada com fuzis e granadas de mão para
atacar os aliados entrincheirados, depois destes serem atingidos durante 8
horas por cerca de 1 milhão de projéteis de artilharia numa frente de 30 km de
comprimento por 5 km de largura. A tática de choque que combinou artilharia e
infantaria em larga escala apanhou de surpresa os franceses, permitindo que as
tropas de choque alemãs avançassem rapidamente, fazendo com que os franceses perdessem
muito terreno no início da batalha. Embora os poucos sobreviventes franceses
tenham continuado a resistir em todos os lados, no final do primeiro dia as
tropas de assalto alemãs tinham sofrido apenas 600 baixas contra milhares entre
os aliados.
• 22 de junho de 1916 – Os alemães bombardeiam com cerca de 200 mil projéteis de artilharia com gás a região do Forte Froideterre (norte da França), durante a Batalha de Verdun, mas os franceses resistem e realizam contra-ataque com reforços vindos de Paris.
• 26 de junho de 1916 – Os ingleses bombardeiam com
gás cloro em projéteis de artilharia os alemães em Fricourt, Beaumont e Serre,
na região do rio Somme, na França.
• 01 de julho de 1916 – Os ingleses usam grandes lança-chamas (Livens) contra os alemães na Batalha do Somme e com eles conseguem vantagem para conquistar trincheiras inimigas.
• 10 de julho de 1916 – Os alemães
tentam incapacitar as tropas de artilharia francesas no Forte Souville com um
ataque com gás disfogênio, lançando mais de 60 mil projéteis de artilharia. O
ataque surtiu pouco efeito, pois os franceses tinham-se prevenido, no início de
1916, com máscaras de gás M2, próprias para este tipo de gás.
• 22 de julho de 1916 – Os alemães
lançam 116 mil projéteis de artilharia com gás fosgênio sobre posições
entrincheiradas francesas na Batalha de Verdun, causando 1.600 mortes como
consequência direta do gás.
• 30
de julho de 1916 – Os alemães atacam com lança-chamas as trincheiras inglesas
que defendiam a aldeia de Hooge, na Bélgica, conseguindo sucessos iniciais que
foram perdidos diante de intensa luta com reforços britânicos vindos da
retaguarda.
• 01 de janeiro de 1917 – Os franceses atacam as trincheiras alemãs em Flanders (Bélgica) com gás e lança-chamas, mas não conseguem resultados expressivos.
• 04 de abril de 1917 – Os ingleses usam pela primeira
vez os projetores Livens para cilindros de gás contra os alemães entrincheirados
na cidade francesa de Arras.
• 09 de abril de 1917 – Os ingleses atacam os
alemães na cidade francesa de Arras, com gás em projéteis de artilharia
juntamente com barragem de artilharia convencional, para manter os alemães em
suas trincheiras durante o avanço das tropas britânicas. Também foram disparados projéteis com gás contra os
cavalos das baterias e contra as colunas de fornecimento de provisões e munições
da artilharia alemã.
• 12 de julho de 1917 – Os alemães introduzem na guerra o gás mostarda contra os ingleses e australianos nas proximidades de Ypres (Bélgica).
• 24 de outubro de 1917 – Em ataque conjunto com os austro-húngaros, os alemães atacam os italianos em Caporetto (norte da Itália) com lançadores de cilindros de gás fosgênio misturado com cloro, sufocando as tropas entrincheiradas no vale da cidade italiana de Plezzo em uma densa nuvem tóxica que superou a capacidade de filtragem das máscaras italianas. 600 italianos morreram no local por conta do gás e o restante da tropa abandonou armamentos pesados e mantimentos numa fuga desorganizada da região. Outros 4 mil italianos expostos ao gás deste ataque foram vitimados nos dias seguintes, entre mortos e doentes.
• 31 de março de 1918 – Os britânicos realizaram
seu maior ataque com projetores de gás, lançando 3.728 cilindros sobre os
alemães em Lens, na França.
• Agosto a novembro de 1918 – Durante a Ofensiva dos Cem Dias, apoiados por grande número de tanques e aviões, os aliados realizam sucessivos ataques contra os alemães, usando constantemente gás e lança-chamas em conjunto com armas convencionais, e conseguem diversas vitórias, fazendo os alemães recuarem e se renderem em 11 de novembro de 1918, terminando com a 1ª Guerra Mundial.
Fonte:
Wikipédia
As armas químicas na primeira guerra Mundial
Obs.: “A História é escrita pelos vencedores” (George
Orwell), que omitem e distorcem as informações conforme suas conveniências! Foi
difícil encontrar detalhes sobre o uso de gás por parte dos aliados na Primeira Guerra Mundial, por isso algumas ocasiões e informações mais detalhadas não constam no resumo
acima.
Trincheira britânica após ataque alemão com gás fosgênio
Fromelles ( norte da França ) - 19 de julho de 1916
Algumas
estatísticas sobre a guerra química na Primeira Guerra Mundial
Cerca de 36.600 toneladas de fosgênio foram fabricados
durante a guerra, de um total de 190.000 toneladas para todas as armas
químicas, tornando-se o segundo gás mais fabricado, atrás apenas do cloro (93,8
mil toneladas):
Quantidade de gás fosgênio produzido na Primeira Guerra
Mundial:
- Alemanha: 18.100 toneladas;
- França: 15.700 toneladas;
- Reino Unido: 1.400 toneladas (embora eles também tenham
usado estoques franceses);
- Estados Unidos: 1.400 toneladas (embora eles também tenham
usado estoques franceses);
Embora o fosgênio nunca tenha ganho tanta divulgação quanto
o gás mostarda, matou muito mais pessoas, sendo responsável por cerca de 85% das aproximadas 91 mil mortes causadas por armas químicas durante a 1ª Guerra Mundial.
A contribuição das armas de gás para
os números totais de vítimas foi relativamente pequena. Registros britânicos
mantidos com precisão a partir de 1916 mostram que apenas 3% das vítimas de gás
foram fatais, 2% ficaram permanentemente inválidos e 70% estavam aptos para o
serviço novamente dentro de seis semanas.
Mesmo assim, a morte lenta e
dolorosa causada pelo gás e a cegueira causada principalmente pelo gás cloro e
gás mostarda causavam constante estresse entre os combatentes.
Número de vítimas por gás
Nação
|
Total de atingidos
|
Vítimas fatais
|
Rússia
|
475.340
|
56.000
|
Alemanha
|
200.000
|
9.000
|
Grã-Bretanha (incluindo o
Canadá)
|
188.706
|
8.109
|
França
|
190.000
|
8.000
|
Itália
|
60.000
|
4.627
|
Áustria-Hungria
|
100.000
|
3.000
|
Estados Unidos
|
72.807
|
1.462
|
Outros países
|
10.000
|
1.000
|
Total
|
1.296.853
|
91.198
|
Fonte:
Terra.Com
Primeira Guerra Mundial: o uso de gás como arma química em batalhas
Obs:
1. O item "Outros países" é referente aos combatentes das colônias da Grã-Bretanha e França.
2. Os números
aqui apresentados são relativos ao militares, não contabilizando civis das áreas
rurais e urbanas próximas aos locais de combate.
Militares da 55ª Divisão Britânica cegos por gás
10 de abril de 1918
Civis e
animais mortos por gás
As vítimas das
nuvens de gases tóxicos não se limitavam às frentes de batalhas. As cidades
próximas eram atingidas pelos ventos que sopravam os gases venenosos. Civis
raramente tinham um sistema de alerta (sirenes ou sinos) para avisar sobre o
perigo e, quando os possuíam, muitas vezes não tinham acesso às máscaras de gás
eficientes ou em quantidade suficiente. Estima-se que entre 100 e 260 mil civis
morreram devido aos efeitos de gases tóxicos durante o conflito e dezenas de
milhares (juntamente com os militares) morreram de cicatrizes nos pulmões,
danos ao cérebro e à pele nos anos seguintes ao fim do conflito. Comandantes de
ambos os lados sabiam que as armas químicas poderiam causar danos graves a
civis, com o vento levando os gases venenosos à áreas urbanas próximas, mas
ainda assim continuaram a usá-las durante a guerra. O marechal de campo
britânico Douglas Haig escreveu em seu diário: "Meus subordinados e eu
estávamos cientes de que tal arma poderia causar danos às mulheres e crianças
que vivem em cidades próximas, pois ventos fortes são comuns na frente de
batalha, no entanto, como a arma era dirigida contra o inimigo, nenhum de nós
estava muito preocupado com os efeitos colaterais”.
Milhares de
cavalos, na frente de batalha e nas áreas rurais e urbanas próximas, também
morreram por conta dos efeitos dos gases tóxicos, bem como criações de gado e
ovelhas, além de animais domésticos como cães e gatos. Também foi considerável
o número de pássaros e animais silvestres mortos pelas nuvens tóxicas. Os corpos dos animais silvestres normalmente nem eram enterrados ou seu número contabilizado em meio à luta
pela sobrevivência nas frentes de batalha e no esforço dos civis para se
manterem em segurança em meio a uma rotina de privações e medo.
Os
lança-chamas vitimaram apenas os militares. Após a guerra, as deformações e mutilações dos veteranos que exigiram mais cirurgias e próteses foram causadas em sua maioria por estilhaços e explosões de artilharia, seguidos pelas queimaduras dos lança-chamas.
Mãe e filha com máscaras para gás
Interior da França - 1918
Não havendo máscaras menores para crianças, estas usavam as de adultos,
por isso as viseiras dos olhos estão na altura do pescoço da menina.
Bastante desagradável a situação de estar sob ataque,
abafado dentro de uma máscara e sem conseguir enxergar o que está acontecendo em volta!
Imagem: http://www.rusmea.com/2014/06/a-frente-ocidental-parte-2-primeira.html
Cavalo alemão usando máscara para gás
1915
O lança-chamas
O lança-chamas (Flammenwerfer
em alemão) causou terror aos soldados franceses e britânicos, quando utilizado
pelos alemães em tropas especialmente treinadas para invasão das trincheiras em
pequenos grupos. O exército alemão testou dois modelos de lança-chamas: um
grande e um pequeno, ambos desenvolvidos por Richard Fiedler. O menor e mais
leve (chamado Kleinflammenwerfer) foi
projetado para uso portátil e era composto por duas seções: o tubo de queima e
o tanque de combustível. Seu acionamento se dava usando o ar comprimido e dióxido
de carbono ou nitrogênio sendo expelido diante de um fluxo de óleo queimado com
um alcance de 18 metros. O segundo, maior (chamado Grossflammenwerfer) trabalhou na mesma linha, mas não foi planejado para o transporte pessoal. Era uma unidade estacionária e seu alcance máximo
era o dobro do modelo menor, podendo sustentar suas chamas por até quarenta
segundos.
O uso inicial na guerra foi contra as trincheiras inglesas em Hoogles (Bélgica), em 30 de julho de 1915. O lança-chamas tendia a ser utilizado em
grupos de seis durante a batalha, cada um com uma guarnição de dois homens – um
carregando o tanque de combustível preso em suas costas enquanto o outro
era responsável por operar a mangueira direcionando o fluxo das chamas. Eram
usados para eliminar a linha de frente dos defensores durante o início de um
ataque, precedendo as tropas de infantaria com fuzis e granadas. Combinado com a
velocidade e ferocidade das tropas de ataque relâmpago (Sturmtruppen em alemão) tornou-se uma arma extremamente eficaz.
Guarnição alemã de lança-chamas atacando uma trincheira
Os
soldados que operavam os lança-chamas rapidamente se tornaram alvos principais
dos tiros inimigos e eram executados quando capturados, tal medo
e ódio despertavam. Outro perigo para as guarnições dos lança-chamas era a
explosão do cilindro com o combustível, causada por um tiro, estilhaço ou
explosão de granada ou artilharia. Os dois homens que operavam o lança-chamas
também estavam sujeitos à explosão do cilindro por falhas nos mecanismos,
entupimento do bico do lança-chamas por terra ou lama (no caso de uma queda
durante a corrida para o ataque), rompimento da mangueira causado por grande
diferença no ritmo de deslocamento entre os dois militares da guarnição nas corridas para atacar ou
corte da mangueira por tiro, estilhaço ou nos arames farpados. Por tudo isso, era curta a expectativa de vida das guarnições de lança-chamas.
Havia um código de conduta – não verbal e oficial – entre os combatentes de que armas como fuzis, baionetas, facas e pistolas matavam individualmente, num duelo dentro de uma "guerra limpa" onde sobreviveria o mais astuto ou sortudo; enquanto as armas de destruição em massa (metralhadoras, gás e fogo) eram instrumentos covardes de uma "guerra suja", que causavam uma morte indigna e sem defesa, portanto, quando os operadores dessas armas eram feridos ou capturados, eram imediatamente executados ainda no campo de batalha, pois não mereciam ser feitos prisioneiros. Sabendo deste procedimento, as guarnições de lança-chamas partiam para suas missões com espírito redobrado de selvageria, sabendo que sua opções seriam vencer, morrer tentando ou, no caso de ser ferido ou na eminência de ser capturado, se livrar do equipamento e torcer para não ser identificado pelos inimigos ou flagrado neste procedimento pelos compatriotas, com pena de ser sumariamente julgado e executado como covarde ou traidor. A vida dos operadores de lança-chamas era – literalmente – fogo...
Seção alemã de lança-chamas (frente) supervisionada por sargento (atrás)
Batalha de Verdun - 1916
O lança-chamas, além de uma arma eficaz fisicamente, também foi uma boa arma psicológica devido ao pânico causado nos soldados. Projetado como arma de ataque, destinava-se a matar simultaneamente grande quantidade de defensores e impedir a aproximação de reforços, mesmo nas trincheiras cavadas em ângulo reto, pois o fogo resvalava na parede e deslocava-se para os lados, impedindo um ataque inimigo direto por conta do calor. As guarnições de lança-chamas só eram vencidas por ataques de granadas de mão, geralmente lançadas acima das curvas da trincheira atacada ou a partir da trincheira de apoio na retaguarda.
A vulnerabilidade e pequeno alcance de ação dos lança-chamas em campo aberto, se comparados aos tiros de metralhadora e fuzil, eram compensados com os efeitos devastadores e duradouros dos ataques aproximados, principalmente contra estruturas fortificadas e os lentos tanques de então.
Rapidamente percebeu-se seu potencial também como arma defensiva destas mesmas trincheiras, formando paredes de fogo para aqueles que conseguissem passar pelo arame farpado. Se os modelos para ataque precisavam ser pequenos e leves para o deslocamento, possuindo uma reduzida capacidade de fogo, os modelos desenvolvidos para defesa eram grandes, com maior capacidade de alcance e tempo de funcionamento. Geralmente eram compostos de grandes reservatórios de combustível enterrados em profundidade na parede traseira da trincheira (para evitar que explodissem no caso de serem alvejados por fogo de artilharia) de onde saía uma mangueira que era apoiada (ou não) num suporte no parapeito da trincheira em direção ao inimigo. Um militar operava a mangueira para a direita e esquerda – ou a levantava um pouco para que o jato de fogo chegasse mais longe – enquanto outro militar ficava encarregado de abrir e fechar o reservatório de combustível, liberando o fogo.
Antes dos lança-chamas, conquistar uma trincheira inimiga era algo muito difícil, mas com a utilização destes na defensiva a tarefa tornou-se praticamente impossível. Os atacantes tinham que avançar pela Terra de Ninguém sob fogo de metralhadoras, fuzis e artilharia; além de ultrapassar uma rede de arames farpados próximos às trincheiras defendidos por metralhadoras e agora também pelos lança-chamas. Superar tantos obstáculos era mais uma questão de sorte do que planejamento ou coragem.
Ilustração de um alemão usando lança-chamas para defender uma trincheira
Após os primeiros ataques alemães com lança-chamas, os aliados superaram a surpresa e medos iniciais e, capturando estes equipamentos de alemães mortos, pesquisaram e adaptaram seus próprios modelos de lança-chamas. Os ingleses produziram equipamentos individuais, ao invés do modelo para dupla, mas seu alcance e capacidade de ataque eram limitados. Os franceses desenvolveram o seu modelo portátil de um homem só (Schilt), com um projeto
superior ao alemão. O lança-chamas francês foi utilizado em ataques às
trincheiras alemãs durante 1917 e 1918. Em resposta, em 1917 os alemães produziram uma versão menor e mais leve do seu lança-chamas portátil (Wex), que permitiu a operação por apenas um homem e tinha o benefício da auto-ignição das chamas ao invés de acender manualmente o fogo, tornando seu uso mais
seguro e rápido.
O modelo individual de lança-chamas se mostrou uma escolha mais eficiente, pois o que se perdia em capacidade de ataque devido ao menor tanque de combustível, se ganhava em agilidade tática, tanto na velocidade de deslocamento quanto na maior possibilidade de chegar aos objetivos planejados, pois permitia que mais militares avançassem simultaneamente e por caminhos diferentes ao encontro do inimigo, tornando menos provável que todos morressem e não atacassem o alvo.
No lança-chamas em dupla, se um dos militares fosse morto ou ferido durante o ataque, o militar sobrevivente não conseguia sozinho conduzir e operar com eficiência o pesado tanque de combustível, correndo o risco da longa mangueira enganchar em algo e romper. Outra desvantagem do sistema em dupla é que era necessário treinamento específico para as funções: o homem de trás (que conduzia o tanque) tinha que saber abrir e fechar a válvula do combustível nos tempos adequados para que o ataque fizesse o maior estrago possível, porém com certa economia, pois uma vez que seu conteúdo terminasse, seria necessário retornar ao ponto de partida para recarregar, e ficar em terreno inimigo sem combustível tornava a guarnição do lança-chamas inútil e vulnerável. Já o homem da frente (que operava a mangueira) tinha que possuir noções básicas de direcionamento (horizontal e vertical) e cuidados com a empunhadura da mangueira para atingir seus alvos com eficiência e não deixá-la cair pois isso poderia significar que o fogo queimaria pernas e pés dos operadores. Também era necessário um certo entrosamento entre a dupla de operadores do lança-chamas para que não tropeçassem um no outro durante os rápidos e tensos deslocamentos sob fogo inimigo, que poderia ocasionar uma lesão muscular, luxação, quebra de osso ou explosão do tanque de combustível.
Por tudo isso, era difícil que outro militar da infantaria – sem treinamento – conseguisse durante a correria de um ataque substituir de forma eficiente e segura o lugar de um dos dois militares especializados na operação do lança-chamas e dar prosseguimento a um ataque bem sucedido.
Durante a guerra os alemães realizaram mais de 300 ataques
com lança-chamas. Não há informações sobre a quantidade de ataques realizados
pelos aliados.
Franceses atacando trincheiras alemãs com lança-chamas
Flandres ( Bélgica ) - 01 de janeiro de 1917
A Primeira Guerra Mundial foi o conflito com o maior uso de
armas químicas na história, tanto na quantidade e variedade dos produtos
utilizados, quanto no número de batalhas em que foram usados.
Desde o primeiro ataque químico em grande escala, em janeiro de 1915, gases tóxicos tornaram-se presentes em quase todas as grandes batalhas e lança-chamas investiram com crescente frequência contra trincheiras fortificadas, casamatas e fortalezas. Foram constantes também os ataques com gás de pequenas proporções apenas com a finalidade de inquietar
e prejudicar o descanso do inimigo.
Novas possibilidades e táticas criadas com a guerra química levaram a uma
corrida para a introdução de novos e mais eficazes gases venenosos e na
produção de contramedidas mais eficientes, que marcaram a guerra do gás, bem como o
desenvolvimento de lança-chamas com diferentes tamanhos e capacidades, até o
armistício em novembro de 1918.
Para mais informações sobre a guerra de trincheiras durante a 1ª Guerra Mundial, acesse:
http://historiasylvio.blogspot.com.br/2014/06/guerra-de-trincheiras.html
Guarnição de metralhadora alemã sob ataque de artilharia e gás mostarda
Passchendaele ( Bélgica )
Consequências da
guerra química
Efeitos na saúde em
longo prazo
Militares expostos aos gases da guerra química muitas vezes apresentaram condições médicas incomuns, o que
gerou muita controvérsia. Foram relatadas fadiga crônica e perda de memória em
alguns afetados por até três anos após a exposição. Alguns estudiosos atuais afirmam
que tais condições poderiam ser consequência de depressão, quadro clínico ainda
não existente para diagnóstico na época.
Há
correlações comprovadas entre a exposição a agentes químicos com cancros da
pele, leucemia, pneumonia e bronquite, várias doenças oculares, depressão da medula óssea e
imunossupressão subsequente, distúrbios psicológicos e disfunção sexual.
Apesar das
evidências dos efeitos na saúde em longo prazo, há estudos que mostraram o
oposto. Alguns veteranos norte-americanos, que foram bastante afetados por
armas químicas, não mostraram nenhuma evidência neurológica nos anos seguintes.
No solo onde
ocorreram ataques com gases ficaram resíduos químicos. Alguns destes locais
foram usados nos anos seguintes ao término da guerra como área para
agricultura, causando contaminação nos consumidores dos produtos ali plantados
e, principalmente, nos agricultores, com impacto sobre o cérebro, sangue,
fígado, pulmões, rins e pele.
Alemães aproveitam a direção do vento para abrir cilindros com gás tóxico sobre os inimigos
1915
Engenhos falhados
Mais de 65.000 km2 da
França tiveram que ser isolados ao final da guerra por causa de engenhos
explosivos não detonados (projéteis de artilharia ou bombas aéreas que não
explodiram ao bater no solo). Cerca de 13 milhões dessas munições foram deixadas no local e, entre estas, 20% dos projéteis químicos de artilharia
falharam. Este
tem sido um sério problema em antigas zonas de batalha até os dias atuais, no século XXI. Projéteis são descobertos quando agricultores aram seus campos e também são
encontrados regularmente quando são feitas obras públicas e construções civis.
Uma dificuldade adicional é o atual
rigor da legislação ambiental. No passado, métodos comuns de se livrar de
munições químicas não detonadas era explodi-las no local onde eram encontradas ou levá-las em navios para regiões profundas do mar e lá despejá-las.
Os problemas para estocagem são especialmente
agudos em algumas regiões no norte da França, onde há grande quantidade armazenada de armas
químicas encontradas e não inutilizadas. Em 13 de abril de 2001 tornou-se evidente as
condições de insegurança destas bombas químicas num depósito em Vimy (norte
da França), quando um vazamento de gás fosgênio obrigou a evacuação de mais de 12 mil habitantes da cidade e retirada das bombas químicas do local, utilizando caminhões refrigerados e sob forte vigilância, para um
campo militar em Suippes, também no norte da França.
A Alemanha tem de lidar com
munições não deflagradas e terras poluídas resultantes da explosão de um trem
de munição química em 1919.
Há alegações de que os resíduos de
veneno permaneceram no ambiente local por um longo período, embora isso não
esteja confirmado. Em 1960, houve comentários de que árvores numa região ao
norte da França retinham resíduos de gás mostarda o suficiente para intoxicar
agricultores e trabalhadores da construção civil que as removiam.
Paiol da 1ª Guerra na França registrou primeiro incidente
Bombas não detonadas em plantação aguardando remoção por peritos
Courcelette - França ( 12 de março de 2014 )
Projéteis de artilharia encontrados por um agricultou francês enquanto arava seus campos
perto do cemitério britânico de Courcelette, um dos locais da Batalha do Somme,
ocorrida entre julho e novembro de 1916.
X X X
Testemunho de uma vítima de ataque químico
Arthur Empey foi um americano que vivia em Nova Jersey em 1914, quando a guerra começou. Enfurecido pelo afundamento do transatlântico Lusitânia e a perda de vidas de passageiros americanos, ele pensou em alistar-se no exército americano para combater os alemães. Como o Estados Unidos não declarou guerra imediatamente, Arthur embarcou em um navio para a Inglaterra e se alistou no exército britânico, sendo imediatamente designado para uma trincheira na linha de frente francesa.
Arthur fazia parte da guarnição de 6 homens de uma metralhadora britânica quando a região em que estava foi atacada pelos alemães com uso de gás cloro. Foi ferido na ocasião e sobreviveu, publicando suas memórias em 1917 no livro "Over the Top", que tornou-se um sucesso de vendas e foi transformado em filme no ano seguinte. Após a guerra, Empey tornou-se escritor, ator, diretor e produtor em Hollywood, falecendo em 1963.
Segue o relato da experiência:
"As condições estavam perfeitas para um ataque inimigo com gás, com uma leve brisa soprando a partir da direção do inimigo, e foi repassado o aviso para estar atento. Nós tínhamos um novo homem no periscópio, nesta tarde em questão, e eu estava sentado no degrau de fogo [parte entre o chão e o parapeito da trincheira], limpando meu rifle, quando ele gritou para mim: ‘Há uma espécie de nuvem esverdeada e amarela rolando pelo chão em frente e está vindo em nossa direção’. Não esperei por mais nada, agarrando minha baioneta, que estava separada do rifle, eu dei o alarme batendo em um projétil de artilharia vazio que estava pendurado perto do periscópio. No mesmo instante, gongos começaram a tocar na trincheira abaixo, o sinal inglês para vestir seu respirador, ou capacete de fumaça, como o chamamos.
O gás viaja em silêncio, de modo que você não deve perder qualquer momento; você geralmente tem cerca de dezoito ou vinte segundos para ajustar seu capacete de gás. Um capacete de gás é feito de tecido, tratado com produtos químicos. Há duas janelas, ou olhos de vidro, pelos quais você pode ver. No interior há um tubo de revestimento de borracha, que vai na boca. Você respira pelo nariz e o gás que passa através do capacete de pano é neutralizado pela ação dos produtos químicos. O ar poluído é exalado através do tubo na boca. Este tubo é feito de tal forma que impede a inalação do ar ou gás que vem de fora. Um capacete é bom para cinco horas de gás mais forte. Cada soldado inglês carrega dois deles pendurado em seu ombro em um saco de lona impermeável. Ele deve usar este saco em todos os momentos, mesmo durante o sono. Para trocar um capacete com defeito, você deve tirar o novo, prender a respiração, puxar o velho de sua cabeça e colocar o novo, com as pontas soltas da parte de baixo dentro da gola de sua túnica.
Em um minuto, um pandemônio reinava em nossa trincheira, ingleses ajustando seus capacetes, bombardeiros acontecendo aqui e ali, homens colocando baionetas em seus fuzis. Reforços chegavam através das trincheiras de comunicação. A guarnição da nossa arma estava ocupada montando a metralhadora no parapeito e trazendo munição extra do depósito.
O gás alemão é mais pesado que o ar e logo encheu as trincheiras e abrigos, onde tem sido conhecido por permanecer por dois ou três dias, até o ar ser purificado por meio de grandes pulverizadores químicos. Tivemos que trabalhar rapidamente, pois os alemães geralmente seguem um ataque de gás com um ataque de infantaria. Um homem da nossa companhia, à minha direita, foi muito lento em seu capacete e caiu no chão, apertando sua garganta e morreu depois de algumas torções espasmódicas. Foi horrível vê-lo morrer, mas estávamos impotentes para ajudá-lo.
No canto da trincheira um cão vira-lata enlameado, um dos animais de estimação da companhia, morre com suas duas patas sobre o nariz. São os animais que sofrem geralmente; os cavalos, mulas, gado, cães, gatos e ratos não têm capacetes para salvá-los. Os ingleses não simpatizam com os ratos mortos em um ataque com gás.
Às vezes, o gás tem sido conhecido por viajar, com resultados terríveis, até 15 milhas atrás das linhas. Um capacete de gás, ou fumaça, como é chamado, tem um cheiro horrível [por conta dos produtos químicos para proteção] e causa uma dor de cabeça violenta em usá-lo.
Nossos obuseiros de dezoito libras atiram na Terra de Ninguém, em um esforço para dispersar a nuvem de gás pela artilharia. A trincheira é forrada com homens agachados, baionetas e granadas à mão para repelir o ataque esperado. Nossa artilharia tinha colocado uma enxurrada de tiros numa cortina de fogo sobre as linhas alemãs, para tentar acabar com seu ataque e reter reforços. Eu ajusto minha metralhadora no parapeito da trincheira e disparo tiros de ajuste.
Então, ao longe, vieram os alemães com as baionetas brilhando, em seus respiradores que têm um grande focinho em frente, parecendo um pesadelo horrível. Ao longo de toda nossa trincheira, fuzis e metralhadoras atiram, os cartuchos das armas ao lado batendo sobre nossas cabeças. Os alemães vêm em montes, com novos tomando o lugar dos caídos [atingidos pelos tiros]. Nada parava sua correria louca. Os alemães chegam ao nosso arame farpado, que anteriormente tinha sido demolido por sua artilharia, então foi granada de mão contra granada e o diabo por todos.
De repente, minha cabeça parecia estourar a partir de um 'crack' alto no meu ouvido. Então, minha cabeça começou a nadar, a garganta ficou seca e uma forte pressão sobre os pulmões me avisou que meu capacete estava vazando. Pego a máscara número 2 e mudo os capacetes. A trincheira começou a enrolar como uma cobra e sacos de areia pareciam flutuar no ar. Escuto um barulho horrível e afundo em meio ao fogo. Agulhas pareciam picar a minha carne e, em seguida, a escuridão. Fui acordado por um dos meus companheiros removendo meu capacete de fumaça. Como foi delicioso o ar fresco que senti em meus pulmões! Um vento forte tinha surgido e dispersado o gás. Eles me disseram que eu tinha ficado apagado por três horas e achavam que eu estava morto.
O ataque foi repelido após uma luta dura. Por duas vezes os alemães conseguiram penetrar em nossa trincheira, mas foram expulsos por contra-ataques. A trincheira foi preenchida com seus mortos e os nossos. Através de um periscópio, contei dezoito alemães mortos em nossos arames farpados; eles eram uma visão medonha com suas horríveis máscaras. Examinei o meu primeiro capacete de fumaça, uma bala tinha passado no lado esquerdo, raspando em meu ouvido, e o gás havia penetrado pelo buraco feito no pano. Em minha guarnição de seis pessoas, dois foram mortos e dois feridos.
Depois que o vento dispersou o gás, os ingleses ficaram ocupados com seus pulverizadores químicos, dissipando a fumaça do gás alemão que se espalhou nos abrigos e partes baixas das trincheiras. Naquela noite, enterraram todos os mortos, com exceção daqueles que estavam na Terra de Ninguém. Na morte não há muita distinção, amigos e inimigos são tratados da mesma forma."
Fonte:
Testemunha Ocular da História
Ataque com gás em 1916
( Em inglês - Usar o tradutor )
Arthur Empey se recuperando de ferimentos recebidos na frente de batalha