quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Rural

A Rural Willys (assim como a Kombi) é um veículo icônico atemporal "pau para toda obra", por permitir transportar grande quantidade de passageiros ou carga, dependendo de sua configuração.
Diferentes versões acomodavam até seis passageiros ou nove passageiros (com o terceiro banco). Sem os bancos traseiros, o compartimento contava com capacidade para até 2.700 litros para bagagens. Pick-Up Willys podia transportar até 500 kg de carga em sua parte traseira.
"A Rural" (como é conhecida carinhosamente por seus admiradores) tem a vantagem de ter nascido com vocação rústica na mecânica e lataria, se adaptando bem tanto no campo quando nas ruas (enquanto a Kombi foi concebida para uso urbano e rodoviário).

Rural Willys com estética brasileira ( a partir de 1960 )
Imagem: http://jornalperiscopio.com.br/site/veiculos-historicos-rural-willys-2 

Rural Willys com estética original estadunidense ( desde 1946 )
Imagem: https://br.pinterest.com/pin/295689531788707401 

A Rural Willys é um veículo utilitário que foi produzido pela empresa estadunidense Willys-Overland (1908-1975) a partir de 1946. A Willys-Overland do Brasil foi fundada em 26 de agosto de 1952, em São Bernardo do Campo (São Paulo). A partir do segundo semestre de 1975 a Rural passou a ser produzida no Brasil pela Ford – que comprou a fábrica da Willys em 1967 – mantendo inalterados o nome Rural e praticamente todas as características do veículo. 
Por aqui, sua típica combinação de cores ficou conhecida como "sai e blusa", sendo a saia a parte inferior branca e a blusa a parte superior colorida.

Nos estágios finais da Segunda Guerra Mundial, a Willys anunciou que iria oferecer um carro de passeio com as mesmas características do Jeep que fabricava para utilização durante a guerra.
Em 1946, foi lançado nos Estados Unidos o Jeep Station Wagon (também conhecido como Willys Station Wagon), utilizando o chassi e visual do utilitário militar, com para-choques robustos e a grade frontal mais reta, mas com a inovação de ser produzido totalmente em chapas de aço (até então, esse tipo de veículo feito de aço era inexistente – existindo modelos com chapas de madeira para fazer que utilitários comuns se tornassem carros de passeio). Para manter a estética então usada, a Station Wagon contava com capô, teto e para-lamas na cor vinho e laterais em creme com painéis em marrom claro para imitar a madeira.
O motor de 2.2 litros era ligado a um câmbio de três marchas, com a opção de uma quarta marcha como overdrive (esse recurso logo se tornou opcional devido à necessidade de uma quarta marcha para melhorar o desempenho). A tração era traseira 4X2 e a opção de tração 4×4 chegou em 1949.

O modelo brasileiro foi redesenhado em 1960 – projetado pelo designer americano Brooks Stevens – utilizando como inspiração a arquitetura moderna de Brasília, em construção na época. Este desenho acompanhou a Rural no Brasil até o encerramento de sua produção em 1977.


Jeep Station Wagon ( USA - 1946 )
Imagem: https://www.noticiasautomotivas.com.br/rural-willys 

Jeep Station Wagon ( USA - 1946 )
Imagem: https://www.noticiasautomotivas.com.br/rural-willys 

Interior do Jeep Station Wagon ( USA - 1946 )
Imagem: https://www.noticiasautomotivas.com.br/rural-willys 

No primeiro Salão do Automóvel realizado no  Brasil – de 26 de novembro a 11 de dezembro de 1960  no Parque Ibirapuera (São Paulo), a Willys-Overland do Brasil S.A. lançou vários novos veículos como o Jeep CJ-6 com 4 portas, a Pick-Up Willys e o pequeno Dauphine. Um dos destaques deste salão foi o novo carro experimental da Willys chamado Saci, um veículo de passeio conversível.
O Saci revelava seu parentesco com a linha Rural Willys, utilizando seu chassi, motor, transmissão, eixos e frente da carroceria, tratando-se de um jipe metropolitano, irmão do "Jeepster" estadunidense.
O Saci nunca chegou a ser fabricado em série no Brasil! Nos Estados Unidos, o Jeepster foi fabricado de 1948 a 1950, vendendo alguns milhares de unidades, mas não chegou a ser um sucesso comercial, pois seu acabamento interior  simples e rústico, idêntico à Rural  não combinava com o alto preço do veículo, que o restringia a um público que priorizava conforto e ostentação.


Willys Saci ( Brasil - 1960 )
Jeepster ( USA - 1948 a 1950 )

Em 1961 entrou em linha a versão picape da Rural, chamada de Pick-Up Willys ou Pick-Up Jeep; nomeada posteriormente como F-75, mantendo-se em produção pela Ford do Brasil até 1983, quando foi encerrada juntamente com o utilitário Jeep. 
A versão militar, utilizada pelas Forças Armadas do Brasil, denominava-se F-220 e passou a ser conhecida por F-85 no momento em que foi permitida a venda ao público civil através de leilões.


Pick-Up Willys ( Renomeada no Brasil como F-75 quando passou a ser produzida pela Ford )
Imagem: https://br.pinterest.com/pin/598064025502086387 


No Brasil foram produzidas versões com tração 4X2 e 4X4, com motores a gasolina de seis cilindros de 2.6 ou 3.0 litros. O motor de 2.6 litros foi o primeiro motor a gasolina fabricado no Brasil. 
Do segundo semestre de 1975 até o final da produção, em 1977, a Rural foi fabricada com motor Ford de 2.3 litros de cilindrada, mais econômico e adequado para a época da Crise do Petróleo de 1973 (protesto dos países árabes, aumentando o preço do petróleo em mais de 400%, pelo apoio prestado pelos Estados Unidos a Israel durante a Guerra do Yom Kippur).
Além da mecânica, também tem o pioneirismo na imprensa automotiva brasileira, sendo o primeiro teste de veículo na imprensa nacional – publicado no dia 5 de dezembro de 1959 – sobre a Rural Willys.


A Rural Willys pode ser considerada a precursora dos atuais utilitários esportivos (SUV, do inglês Sport Utility Vehicle, "Veículo Utilitário Esportivo" aliando conforto, espaço e versatilidade) pois era um automóvel para a família, mas robusto e com vocações off-road, capaz de enfrentar ruas e estradas de terra mal conservadas.
Com o aumento da altura da suspensão e do tamanho dos pneus, versões personalizadas da "Rural Off-Road" ganham mais resistência e estabilidade, inspirando respeito!

Rural 4X4 Off-Road
Ford F-75 4x4 Turbo Off-Road
Rusticidade de raiz

Fontes de referência:

Wikipédia
Rural Willys

Wikipédia
Willys-Overland do Brasil

Notícias Automotivas
Rural Willys: história, anos, versões, motores (e detalhes)
O nascimento da indústria automobilística brasileira e o primeiro teste de carro no país
Vídeos:

Rural Willys, Tudo O Que Você Precisa Saber!
(10:46)

Rural Willys e Pickup: curiosidades dos “filhos” do Jeep
(5:14)


Se interessar em ver a publicação neste blog sobre a Kombi, acesse:
https://historiasylvio.blogspot.com/2018/08/kombi.html 


domingo, 16 de agosto de 2020

Deriva



Andança

Depois de muitos anos, fui visitar tia Chiquinha. Ela continuava na antiga casa da cidade, agora com uma filha viúva. Apesar de quase paralítica e bastante idosa, estava lúcida e gostava de conversar.
Da cama aonde se encontrava recostada, seus olhos se concentraram em mim logo que entrei no seu quarto. 
– Entra, meu filho.
Depois de um momento de dúvida, olhou-me melhor e arriscou:
– Ocê é neto do Zezé, não é?
– Sou, sim senhora.
– Filho de qual é?
– Da Julieta.
– E como é que ela tá? Não aparece faz tempo!
– Vai bem! E a senhora, como vai indo?
– Eu? Como Deus é servido. A cabeça tá boa, o corpo é que não vale mais nada. Só saio daqui pela mão dos outros. Fiz tratamento, passei fora um tempo, não adiantou quase nada. Diz o médico que secou o óleo da espinha, fiquei dura das cadeira.
– E dormir, a senhora dorme bem?
– Durmo. E sonho muito. 
– Com quê?
– Com lugar onde morei, pessoal que conheci. Outro dia mesmo fui pra perto de Calafate, onde hoje mora o Anselmo meu filho.
– E como é que são as coisas?
– Igualzinho quando a gente vivia lá. A casa, o curral, a horta, tudo como antigamente, não é como agora não.
– E na Chapada, tem ido lá?
– Vou muito. Ontem mesmo fui lá.
– E o que a senhora fez?
– O de sempre: coei café, soltei as galinhas, aguei a horta...
– E moer cana?
– Muita, só vendo. Aquela tacha enorme, melado do pingo e ponto, rapadura.
– Tinha açúcar secando?
– Aquele colosso de jirau, de açúcar com umas pedras clarinha. Daquelas que derrete fácil na boca. Fica cheio de abelha no lugar.
– Que mais a senhora fez?
– Depois do almoço areei panela, aí fiquei olhando o fogão de lenha a passei a mão nele. Tinha uns buraco perto do forninho. Então pensei: esse fogão carece de um conserto, vou pedir Pedrinho pra chamar o Altino aqui em casa. Ele é vagaroso mas de confiança.
– Mais o quê?
– Fiquei alisando o fogão um tempo, sentindo ele na mão. Nessa hora eu acordei. Tava passando a mão nesse travesseiro, assim... meu fogão. Tem hora que eu fico pensando: se o corpo já não aguenta a vida, como é que a cabeça ainda consegue levar a gente pra cada lugar tão longe?

Texto adaptado do livro “Casos de Minas”, de Olavo Romano.
Págs. 171 e 173.
Edição: 1982

Livro - Casos de Minas

A memória de Minas Gerais recuperada em histórias e "causos" populares. Textos fluentes e com humor. O autor vai no fundo de sua memória e de lá resgata certas coisas que ele gostaria que não morressem: um som particular, um cheiro impregnado, bichos, gentes, situações. Ele não cai na arapuca das descrições, narra apenas. O estilo é limpo, sem maquiagem, e encaixa perfeitamente com as histórias. A sabedoria, a malandragem, a essência do homem de interior – está tudo aqui, inteiro e intacto. E sua linguagem é respeitada, sem deformações gráficas.